É sabido por todo mundo que o punk rock teria começado na década de 70 em Londres, porém, o livro Dicionário de Punk e Hardcore, recém-publicado, aponta que os precursores do punk eram jovens de 19 anos que cantavam em espanhol e viviam em Lince, um distrito de Lima, capital do Peru.
A banda se chamava Los Saicos e durou apenas três anos. Seu auge foi em meados da década de 60, mas apesar de terem tido reconhecimento, nunca gravaram um álbum.
O nome original do grupo era Sádicos, mas, por uma autocensura, decidiram tirar o "D", passando a soar parecido com "psycho" (psicótico, em inglês). Pelo menos essa é uma das versões que circulam sobre o nome da banda. E, embora sua canção mais conhecida, Demolición, parecesse uma manifestação de rebeldia juvenil precoce para sua época - os grandes protestos estudantis em vários países eclodiram somente em 1968 -, o conjunto garante que não pretendia enviar nenhuma mensagem mais profunda.
Quem afirma isso é César "Papi" Castrillón, ex-baixista dos Saicos,que vive hoje em Stafford, no Estado americano da Virgínia, a cerca de 85 km de Washington. "Realmente éramos muito loucos nessa época e levávamos as coisas muito na brincadeira", disse em entrevista à BBC. "Fizemos as canções com esse propósito, porque, se você escutar Demolición, El Entierro de Los Gatos ou Cementerio se dará conta de que nada é a sério. Queríamos expressar em espanhol a maneira como nós, peruanos, nos sentíamos. Além disso, havia muita paz nessa época".
Papi integrava o grupo com o guitarrista Rolando Carpio, já morto, o vocalista Erwin Flores e o baterista Francisco "Pancho" Guevara. Se os Saicos não eram os únicos, provavelmente eram os roqueiros mais originais de sua geração. "Era 'cool' que o vissem (Erwin) cantando em inglês. Todo mundo cometeu o erro de começar a fazer covers, mas nós não nos demos conta de que estávamos cometendo este erro, porque não era essa a nossa intenção. Simplesmente queríamos mostrar o que éramos e a única maneira de fazer isso era dizendo as coisas cômicas que dizíamos em nossas músicas".
Desenterrados
Único dos Saicos ainda morando em Lima, Pancho Guevara ficou surpreso com o ressurgimento do interesse por seu velho grupo, agora chamado de "o precursor do punk". "O punk é uma onda meio rara e nós fazíamos rock´n´roll", comentou. "Se agora dizem que éramos punks, o assumimos. É algo estranho, porém bem-vindo. Mas quando escuto os Sex Pistols e outras bandas, não as acho parecidas com a nossa música".
Único dos Saicos ainda morando em Lima, Pancho Guevara ficou surpreso com o ressurgimento do interesse por seu velho grupo, agora chamado de "o precursor do punk". "O punk é uma onda meio rara e nós fazíamos rock´n´roll", comentou. "Se agora dizem que éramos punks, o assumimos. É algo estranho, porém bem-vindo. Mas quando escuto os Sex Pistols e outras bandas, não as acho parecidas com a nossa música".
Castrillón concorda: "o curioso é que nunca escutei punk nos anos 1980, quando fui viver nos Estados unidos. Dediquei-me exclusivamente à família e não me interessou o rock em especial. A mim, sempre interessou toda a música".
De fato, ao enumerar seus artistas favoritos, ele mostra gostar de estilos bem distantes da música que consagrou Ramones e Sex Pistols. "Agrada-me, por exemplo, Andrea Bocelli, Caruso, Mario Lanza. Se havia boas canções punk, eu as escutava, mas, se não gostasse delas, não ouvia. Nunca me associei aos punks".
De fato, a única grande identificação com os representantes do movimento é que, assim como eles, Castrillón e seus ex-companheiros não tinham o menor conhecimento de seus instrumentos: simplesmente queriam se expressar. "Há muitas bandas punks que não têm a menor ideia da música que estão fazendo, mas se divertem com isso. Não havia uma técnica musical, nós simplesmente tínhamos essa alma de músicos", explicou.
Mas será, então, que canções como Demolición são realmente subversivas, como o punk, mesmo considerando que não tinham por trás interesses políticos? "Sim, certamente", afirmou Guevara. "Todos temos algo que nos ferra, que nos revolta e que nos dá vontade de destroçar, de demolir. Isso é natural aos 18 anos. Qualquer um fica revoltado e muito desbocado nessa idade, e, se você tem a oportunidade de fazer rock...".
Renascimento
Os Saicos tiveram sua idade de ouro entre 1965 e 1966 e chegaram até a ter um programa na televisão, mas foram lançados apenas seis compactos, sem nunca ter sido gravado de fato um álbum completo. "Sempre tivemos a intenção de gravar um disco", diz Guevara. "Mas as músicas próprias requeriam muito tempo para elaborar e fazer os arranjos. Levamos um ano para fazer essas canções e, depois, não tínhamos mais tempo com todos os compromissos e apresentações."
Os Saicos tiveram sua idade de ouro entre 1965 e 1966 e chegaram até a ter um programa na televisão, mas foram lançados apenas seis compactos, sem nunca ter sido gravado de fato um álbum completo. "Sempre tivemos a intenção de gravar um disco", diz Guevara. "Mas as músicas próprias requeriam muito tempo para elaborar e fazer os arranjos. Levamos um ano para fazer essas canções e, depois, não tínhamos mais tempo com todos os compromissos e apresentações."
Com o tempo, o grupo acabou, com seus integrantes saturados de se ver todos os dias ao longo de três anos. O vocalista chegou até a estudar física em Washington e trabalhou para a Nasa, a agência espacial americana.
Agora, ninguém poderia dizer que, em pleno século XXI, ressurgiria o interesse por este grupo relativamente obscuro vindo de um país sul-americano desconhecido por sua produção roqueira. "É uma honra que, depois de 45 anos, nos reeditem", diz Guevara. "Mas a coisa começou quando descobriram o LP na Espanha, em 1998, e ali começou a onda de novo na Europa. Tentaram nos localizar, até que, em 2006, nos pediram que fizéssemos um show." Depois disso, finalmente foram reconhecidos como os precursores do punk através de um documentário sobre a banda - Saicomania, de Héctor Chávez, teve ingressos esgotados em sua estreia, em Lima.
Tudo isso ocorreu porque outro peruano foi viver na Espanha em 1995, levando uma fita cassete com a música dos Saicos, que foi tocada durante uma entrevista na rádio nacional do país. "Os garotos de 20, 30 anos, agora conhecem as nossas músicas", diz Castrillón. "Estivemos na Espanha e as pessoas cantaram as canções como se fossem suas. No México e na Argentina, ocorreu o mesmo e, agora, nos querem tocando na Inglaterra, nos Estados Unidos", enumera, afirmando, no entanto, não ser mais possível fazer o que poderiam ter realizado há mais de quatro décadas quando se lançaram. "Já temos 66 anos e isso tudo pode nos dar artrite...", disse com ar nostálgico, "ou um sopro no coração".
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Esse post foi indicado pelo internauta Bernardo Camara, em nosso grupo do Facebook
FONTE: TERRA